Hoje, 8 de março, mundialmente, é celebrado o Dia da Mulher, representando a luta das mulheres por maiores direitos. A data, no calendário, é motivada por um protesto ocorrido na Rússia, embora muitas pessoas no Brasil acreditem que esteja relacionada a um incêndio em uma fábrica de tecidos nos Estados Unidos.
O fato é que este dia, ao longo dos anos, revela a necessidade de um olhar mais amplo, as pautas devem ser expandidas, e essa data deve ser ressignificada em vários sentidos.
A mulher ilustrada nesse dia costumava ser sempre uma mulher branca e europeia. Vamos falar da mulher em toda a sua totalidade: a mulher negra, indígena, quilombola, trans. É importante lembrar que esta data foi firmada a partir de um movimento de trabalhadoras que não incluía tais. O reconhecimento das mulheres trans é uma luta que ainda perpetua, representando pequenas vitórias, se é que se pode atribuir tal termo, já que a mulher transgênero ainda luta pelo direito de existir.
As mulheres brancas lutavam pelo direito ao voto feminino, enquanto as mulheres negras, lutavam para poder alimentar seus filhos. Lutas desiguais! Como o direito de voto conquistado tardiamente para as mulheres negras, num contexto posterior à conquista pelos homens negros e pelas mulheres brancas.
Ao rememorarmos o processo de conquista do direito ao voto para as mulheres no Brasil, é impossível ignorar a faceta obscura da exclusão que recaiu sobre a mulher negra. O Decreto nº 21.076, de 24 de fevereiro de 1932, que supostamente abria as portas da participação política feminina, se revela como um marco que, apesar de avançado para a época, perpetuou injustiças ecoando até os dias de hoje.
A exigência de alfabetização como critério para o voto, estabelecida naquele contexto, refletiu diretamente nas mulheres negras. Num Brasil em que a abolição havia recém-acabado, onde o acesso à educação era desigual, essa condição impôs barreiras para quase todas elas.
A mulher negra, já marginalizada historicamente, se viu duplamente excluída de um direito que deveria ser universal. E não parou por aí, na Constituição de 1934, o direito de voto era apenas para mulheres que eram servidoras públicas, acentuando ainda mais as divisões. A luta pela inclusão foi adiada para 1946, mas mesmo então, as cicatrizes da exclusão persistiam.
O processo histórico mostra que, durante décadas, a mulher negra teve sua voz silenciada e seus direitos negligenciados, submetida a uma dupla opressão: a de gênero e a racial. A resistência à participação política plena dessas mulheres não foi apenas uma negligência acidental, mas sim um reflexo de uma sociedade que, mesmo avançando em alguns aspectos, continuou a perpetuar estruturas racistas arraigadas.
A crítica a esse processo não é apenas um exercício de reflexão histórica, é um chamado urgente para reconhecer as persistentes desigualdades e trabalharmos para superar as barreiras que continuam a marginalizar as mulheres que não foram representadas nos protestos russos, sendo-lhes negado o pleno direito à participação política e social.
Mas afinal de contas, o que é ser mulher? Quem pode definir? Ser mulher é se sentir mulher! Transcende definições externas, é uma experiência íntima e pessoal, sentindo a complexidade de ser, fluindo entre identidade, força e sensibilidade. Um entendimento que se molda na diversidade das vivências femininas, resistindo a rótulos. Que todas as mulheres , possam se sentir representadas neste dia, respeitando a individualidade de cada uma, mas entendendo que somente juntas seremos capazes de remodelar a narrativa.
Texto: Larissa Nunes, jornalista política e ambiental, mulher negra ativista.